quinta-feira, 25 de agosto de 2011

História do parto de Helena

Nas últimas semanas de gravidez, me peguei lendo histórias de parto. Os relatos tão diversificados de como a coisa toda acontece foram um tipo de preparação para quando o momento chegasse, já que receita de bolo, em gravidez, não existe. Ficava pensando em como seria, o que eu sentiria, se saberia reconhecer quando a hora chegasse. E por isso, e também para registrar a chegada de Helena, não podia deixar de contar a história do parto dela aqui.

No começo de julho, meu médico começou a ver que a placenta estava grau III. Isso significa que ela está ficando envelhecida, calcificada e começa a deixar de nutrir o bebê. Não é algo para se preocupar, tampouco indício de que está chegando a hora, mas algo para prestar atenção.

Então, com 37 semanas de gravidez, peguei licença médica e a espera começou pra valer. Ficar em casa não é muito fácil, com tamanha ansiedade, então, muito menos! Mas era uma forma de eu me afastar do stress da agência e cuidar somente da minha bebê.

A expectativa era de que ela nascesse com 38 semanas. Fomos à consulta semanal e o quadro não se alterou. Lá estava a placenta envelhecendo e a esta altura Helena não estava ganhando o peso todo que costumou ganhar durante a gravidez inteira. Mas ainda podíamos esperar mais.

Meu médico sugeriu fazer caminhada, isso poderia ajudar a entrar em trabalho de parto e também me preparar para o normal. Foi o que comecei a fazer. Minha mãe já tinha vindo do interior e começamos a andar pelo bairro. Subia e descia ladeiras e escadas todo santo dia. Morria de dor na pelve, mas devo avisar que esse tipo de dor me acompanhou a gravidez inteira.

Com isso, entramos na semana 39. Juro que bateu o desespero. A essa altura, comecei a inchar de verdade. Não foi só impressão, eu realmente fiquei grande. Olhava meu rosto e tinha vontade de chorar. Ganhei pouquíssimo peso na gravidez inteira, mas o inchaço me fazia mal. Do nada eu acordava com o rosto grande. Não que tenha ficado com nariz de batata, isso não me aconteceu. Mas olhava e não era eu.

Foi então que na segunda-feira, dia 18, um dia quente de inverno, eu resolvi passar o tempo assistindo alguns seriados, precisava me distrair pra não enlouquecer. Coloquei The Tudors na máquina e fiquei deitada no sofá. Lá pelas 17h, senti um jatinho de água lá embaixo. Algo descendo, mas que poderia muito bem ser a secreção normal que toda grávida tem. Só que, como estava deitada, achei suspeito. Falei "oh, ow" pra minha mãe e disse que senti algo descendo. Corri pro banheiro e assim que sentei na privada, um jato de água transparente saiu de mim. Felicidade extrema! A hora tinha chegado. Minha mãe entrou num minipânico e tive que acalmá-la. Liguei então para o Rodrigo, que estava trabalhando, e rindo de alegria disse que a hora tinha chegado, que minha bolsa tinha estourado e que nossa menina iria chegar!

Ele veio e já ligou para o médico, que nos mandou ir para o hospital. Com calma, consegui tomar um banho, procurar mais absorventes para tanto líquido que descia e pegar tudo o que estava pronto. Conseguimos até tirar fotos dos nossos últimos momentos a dois. Quando fui para o carro, Rodrigo me mandou olhar para nossa casa e vê-la pela última vez da forma como a conhecíamos. Porque depois tudo iria mudar, teríamos ainda mais alegria neste lugar que escolhemos para morar.

Chegamos ao hospital por volta das 18h. Nem a toalha que levei na mão segurava o aguaceiro que escorria de mim. Eu dava risada enquanto pegavam uma cadeira de rodas para me levar para o andar onde Rodrigo daria minha entrada e onde o médico logo iria me encontrar.

Pedimos um quarto especial do Einstein chamado Labor Room. Eles tinham que montar, pois esse é um quarto que tem aparelhagem para também ser uma sala de parto normal. Fiquei um tempinho esperando na sala de pré-parto, onde o Dr. Cordioli confirmou que a bolsa estava rompida e que eu tinha meio dedo de dilatação, mas nadinha de contração.

Fomos acomodados no quarto e uma equipe de enfermeiras já foi apresentada, seriam elas a cuidar de mim durante as horas seguintes. Meu médico prescreveu soro com ocitocina para que eu pudesse ter as tais contrações que não vinha tendo. Sem elas não iria dilatar. Ele foi para casa descansar e me deixou muito bem acolhida por algumas horas, com um colega também da maternidade e as enfermeiras.

Me recomendaram andar pelo corredor e foi o que eu fiz. Daí comecei a sentir as contrações. Vou ser muito sincera: não sei mais descrever que tipo de dor é. Não é uma cólica forte, como dizem. É uma contração de tudo o que existe dentro de você. Doída mesmo, mas nesse ponto estava bem suportável. Eu andei pelo corredor e quando a contração vinha eu tinha que parar e apertar o braço do Rodrigo. Depois fui para o quarto e as enfermeiras foram monitorando tudo, eu e o bebê. Nisso já era 1 da manhã. Aí a ocitocina bateu forte e a coisa apertou. Me colocaram num cavalinho que balança e onde se pode fazer um pouco de massagem nas costas. Isso só distrai, pra falar a verdade. Fazer a dor passar, que nada!

Pedi para entrar na banheira do quarto, para ver se aliviava. Respirava fundo, tentava não me perder na dor, mas em alguns momentos ficava difícil. Dentro da banheira parece que melhora, mas também dizem que a indução faz a coisa ser mais difícil. Isso não sei. É uma dor que te faz perder a paciência. Fui tentando aguentar. Saí da banheira irritada... ficava me perguntando onde estava com a cabeça de não ter partido logo pra cesárea. As enfermeiras iam acompanhando tudo, tentando também me entreter um pouco.

Lá pelas 3h da manhã eu desisti de sofrer. Já estava sentindo minha pressão no pé, com cara de derrotada, olhei pro Rodrigo e pedi para chamar médico, anestesista, a equipe toda, que eu iria tirar aquilo de dentro de mim ali mesmo, do jeito que fosse.

Em pouquíssimos minutos o Cordioli estava ali. Fez o exame de toque (dolorido também, mas pelo menos tirava o foco da dor da contração) e eu tinha uns 4 dedos de dilatação só, mas muito provavelmente conseguidos pela tentativa de relaxar na água. Em seguida chegou o tão aguardado anestesista, Antônio. Santo Antônio, melhor dizendo. Enquanto eu me contorcia de dor, ele sentou e calmamente foi perguntando meu histórico médico. Sempre explicando os procedimentos que iria realizar como se eu, Rodrigo e minha mãe fôssemos médicos, ele foi calmamente ganhando tempo em me manter ativa sem anestesia. Não sei se foi de propósito, acho até que não, mas o fato é que fui suportando a dor, que a essa altura era terrível mesmo. Depois disso tudo, umas 4h, ele colocou ali no quarto mesmo um cateter por onde iria introduzir a anestesia combinada. Não doeu nadinha colocar a agulha, que é enorme, nas costas. Eu acho que todos esses procedimentos são uma bobagem bem grande, são passageiros e rotineiros. Então fiquei bem imóvel enquanto ele colocava, pensando que, afinal, a gente tem que colaborar.

O tempo todo Cordioli e equipe iam explicando o que estava acontecendo comigo e com o bebê. E iam também brincando com a gente e uns com os outros, porque isso ajuda muito a relaxar. Inclusive nos momentos mais tensos, pois começou a acontecer o seguinte: conforme a dose de ocitocina ia aumentando, os batimentos cardíacos do bebê mudavam de ritmo. Mas eu não tinha contração e, por consequência, dilatação, sem a ocitocina. Então era aumentar e baixar, aumentar e baixar. Depois que o Antônio começou a me anestesiar, a vida ficou cor de rosa. De cinco em cinco minutos ele perguntava o nível de dor de 0 a 10. Engraçado que eu sentia a tal dor na pelve, proveniente da contração, mas só de um lado, fraquinha, fraquinha. Tava ótimo assim, mas ele queria melhorar.

A anestesia combinada é incrível. Ali, pelo cateter, você recebe a dose e o anestesista vai controlando o nível de medicação, num processo que minha mãe chamou de artesanal. Sentia e conseguia mexer minha perna e meus pés, só não sentia dor. Conseguia mover meu quadril, o que me deixava cada vez mais pronta para a expulsão.

Pelos cálculos dos médicos, eu ficaria nessa situação até o dia seguinte, quiçá até umas 13h! Era muito tempo, mas confesso que encararia, já que não estava mais sofrendo.

O problema estava no controle da ocitocina com os batimentos cardíacos da Helena. Lá pelas 6h da manhã, eu estava ainda com 6 dedos de dilatação e foi quando a cesárea passou pela minha cabeça de novo. Se no próximo exame de toque não tivesse algum progresso, iríamos ter que rever as decisões. Toca fazer piada e tentar relaxar. Rodrigo foi dormir no sofá. Minha mãe estava quase também. Antônio aproveitava o tempo para ler. Eu estava atenta e bem acordada, não queria perder um segundo dos momentos que estava vivendo, os mais importantes da minha vida.

Às 7h da manhã, novo exame de toque. Nove dedos e meio de dilatação. Juro, eu gritei de alegria. Nunca acreditei, depois de ver tantos relatos de amigas que fizeram cerárea, que eu seria capaz. A coisa que mais ouvi a vida inteira sobre as cesáreas é que elas aconteceram por falta de dilatação, entre outras. E uma das coisas que a anestesia pode fazer negativamente por você é interromper o processo de dilatação. Por isso os médicos preferem que ela seja dada mais tardiamente. Mas comigo foi o contrário (e isso acontece com outras pessoas também): sem dor eu relaxei ainda mais e a coisa toda aconteceu! Aí sim, a equipe começou a se mover para transformar o "room" em "labor room". A equipe de enfermeiras mudou, entrou outro turno, e os assistentes do Cordioli foram chamados.

Do nada a cama se transformou em cama de parto normal, as luzes foram abaixadas, aventais, lençois e vestimentas de cirurgiões foram aparecendo. Acho que tudo isso levou um tempão, mas para mim passou voando. Até eu ficar pronta para começar o período de expulsão, era umas 10h. A primeira coisa que fiz naquela posição ingrata de ficar com as pernas levantadas foi um teste, orientado pelo Dr. Mariano, assistente mais que fundamental no processo. Eu tenho que falar a verdade: na minha gravidez inteira eu nunca senti a barriga ficar dura. Tendo contração ou não, a minha barriga sempre foi uma pedra, então a mão do Dr. Mariano foi minha guia no momento de saber fazer força. Até porque eu estava anestesiada também.

Basicamente o que você tem que fazer é juntar todo o ar que puder quando o médico avisar que a contração está vindo. E, quando ele disser para empurrar, é jogar uma força descomunal lá para baixo, meio que sem saber para onde, confiando no seu instinto. Não sei se alguém não saberia o que fazer, mas neste momento eu agradeci mais uma vez ao ballet por me fazer entender tão bem meu corpo e todas as suas possibilidades. Claro que não é mérito só de bailarinas, mas acredito muito que as coisas tenham sido fáceis para mim por causa da dança. Sou pequena, mignon, mas tenho uma força que ninguém acreditou. E um dos pré-requisitos para ter um parto assim é ser meio que atleta, do jeito que for.

Foram muitas tentativas de empurrar. Cansa sim, mas entre uma e outra você tem tempo para respirar bastante e recobrar suas forças. Eu estava ótima. Mesmo. Tinha uma alegria tão grande, tão intensa, dentro de mim, que reclamar de qualquer coisa estava absolutamente fora dos planos. Eu estava tendo o parto que sempre sonhei, e isso não é pouco, não.

Os médicos brincavam bastante e conversavam com o Rodrigo, ali do meu lado direito, me ajudando em cada minuto. Na TV bem à minha frente passava um programa infantil. Lembro que vi o Bob Esponja. Acho que estava rolando uma aposta entre os médicos, porque o Cordioli disse que ela iria nascer às 11h30. Alguns achavam que mais, outros que menos. Falaram sobre futebol. Eu dava risada de tudo, estava em casa. Cada expulsão parecia ser a última, pois o cabelinho da Helena já aparecia. Tiveram que fazer a episiotomia. Não me importei e ainda pedi que o serviço fosse bem feito. Então, pontualmente às 11h30 do dia 19/7/2011, Helena veio ao mundo. Chorando bastante, vermelhinha, direto pro meu colo. Foi uma explosão dentro de mim e acho que dentro do pai dela também. Era surreal e real ao mesmo tempo. Nossa menina tinha chegado, com força, avisando que a vida seria muito melhor dali para a frente.

Acho que chorei o tempo todo depois, enquanto minha filhinha recebia nota 10 no teste de Apgar. Rodrigo tentava registrar as coisas que não se podem, tamanha emoção! E ali começava de verdade minha vida de mãe.

De todas as histórias de parto que ouvi, até mesmo durante a minha gestação, na minha havia alguns vários motivos para não ter passado pelo que passei. Minha placenta não era lá aquelas coisas, não tive contrações, a ocitocina prejudicava os batimentos cardíacos da minha filha e, para completar, Helena estava com o cordão enrolado no pescoço. Nada disso, nada mesmo, foi impedimento para ter um parto normal. Este, obviamente, é um caso isolado, é minha história, mas, sendo assim, no meu caso o parto normal aconteceu muito mais porque a equipe médica colaborou. Depois perguntamos para o Cordioli se ele preferia fazer normal e ele disse que não, que a cesárea é muito mais fácil. Mas por que ele concordou em ficar a noite inteira esperando para a coisa acontecer comigo? Ele respondeu que foi porque eu quis. Porque eu pedi isso a ele, e que ele estudou para atender o que o paciente deseja.

Acabo de perceber, relendo meu próprio texto, que tudo aconteceu porque todos nós quisemos. Helena, bem-vinda a este mundo em que ainda se podem realizar sonhos.

Chegou a hora!

Dr. Mariano Tamura

Dr. Eduardo Cordioli e Gladys

Cordioli em ação

Helena chegou!

Segurando a mão do papai

Nota 10!

Minha filha!


Helenamaislindadomundo


Para sempre